Prognósticos: como saber o quanto dizer a cada paciente?
Conversar com pacientes sobre prognóstico pode ser algo difícil, principalmente se falamos de condições como câncer. Discutir o que o paciente pode esperar da evolução de sua doença é um desafio diário para oncologistas, mas que também afeta médicos de várias outras especialidades.
E qual seria a melhor maneira de lidar com esse tipo de conversa? Por padrão, realismo, otimismo e evitação são as estratégias mais comuns utilizadas pelos médicos para discutir prognóstico[1]. Porém, apesar de cada uma ter características úteis, nenhuma é completamente satisfatória, principalmente se consideramos as particularidades de cada paciente.
A abordagem
O que se tem percebido como ideal é trabalhar princípios de negociação e uma abordagem centrada no paciente, buscando entender o quanto cada paciente deseja saber sobre sua condição, por que ele quer ou não saber certas informações, e assim negociar o que será passado a ele tanto respeitando sua vontade, mas sem que isso de alguma forma possa interferir nas melhores tomadas de decisão quanto ao tratamento.
Uma abordagem com foco no paciente requer que os médicos se sintam à vontade com habilidades fundamentais de comunicação, como detectar emoções, responder empaticamente e garantir a compreensão do paciente.
O quanto o paciente quer saber
Enquanto alguns pacientes estão prontos para saber tudo, outros preferem não saber nada ou apenas algumas partes. Cabe ao médico então descobrir que tipo de informação prognóstica discutir com um determinado paciente, em um determinado momento e como individualizar a discussão.
Um estudo qualitativo[2] concluiu que os médicos podem fornecer a quantidade certa de informação para um paciente em particular somente depois de elicitar os objetivos e valores do paciente.
Em primeiro lugar, o médico deve ter a certeza que o paciente sabe do que se trata 'prognóstico'. É importante sempre usar termos claros, perguntando, por exemplo "O quanto você gostaria de saber sobre a provável evolução da sua doença?". Este tipo de pergunta exige uma resposta mais completa do que simplesmente sim ou não, permitindo entender melhor os desejos do paciente para então saber o que e quanto dizer a ele: "Algumas pessoas querem muitos detalhes, outras querem o quadro geral e outras preferem que eu fale com a família. O que seria melhor para você?".
Aproximadamente 20% dos pacientes não querem discutir informações prognósticas ou apenas querem ouvir boas notícias[3],[4]. Portanto, é importante observar também na resposta do paciente a linguagem corporal e o comportamento para saber se o que o paciente respondeu é realmente o que ele deseja, ou se talvez não teve coragem de dar a resposta que gostaria. Caso o médico perceba alguma hesitação, é bom tentar explorar de modo sutil, como "Notei que está um pouco hesitante, você tem certeza sobre o que gostaria de saber?".
Desse modo, chegando a uma conclusão sobre a vontade do paciente, é hora de saber como lidar com cada caso — aqueles que querem informação, os que não querem e os que são ambivalentes.
Paciente que quer informação
Para os pacientes prontos a receber informações sobre o prognóstico de sua doença, recomenda-se primeiro negociar os conteúdos que eles têm interesse de saber, como estatísticas, melhor e pior cenários, possibilidade de eventos específicos no futuro, etc.
Definindo isso, a informação deve ser entregue de forma direta, usando enquadramentos tanto negativos quanto positivos.
Ao passar as informações, é importante que o médico demonstre que reconhece as emoções do paciente e família em resposta ao prognóstico informado, dando chance para que estes se abram e possam talvez tirar outras dúvidas, sempre mostrando suporte.
Por fim, o médico deve conferir se o paciente e família entenderam corretamente pontos mais complexos sobre a informação que tiver sido dada, pedindo, por exemplo, que o paciente diga o que entendeu da explicação ou como ele vai explicar para outra pessoa, além de perguntar se o paciente recebeu a informação que esperava e se há algo mais que queira saber.
Paciente que não quer informação
Aqueles que preferem não saber sobre prognóstico criam uma situação complicada para o médico. Se por um lado ele deve respeitar a decisão do paciente, por outro ele se preocupa que esperanças, ao invés de fatos, possam afetar a tomada de decisão do paciente.
Neste caso, então, é importante primeiro saber por que o paciente não quer saber o prognóstico, de modo que o motivo possa talvez ser contornado, abrindo a discussão sobre o assunto. Segundo, deve-se manter em mente que nem sempre a tomada de decisão requer que o paciente entenda informações detalhadas de prognóstico. Forçar no paciente uma informação que ele não quer é perda de tempo, já que além de não escutar, pode afetar negativamente a relação de confiança com o médico.
Reconhecer as emoções do paciente pode capacitá-lo a processar sua própria reação emocional e dar a ele tempo suficiente para que consiga prosseguir com o tópico do prognóstico, que é algo importante e assustador ao mesmo tempo. Nesse sentido, o médico deve demonstrar empatia com as emoções pelas quais o paciente está passando.
Ele deve ainda analisar consigo mesmo se o prognóstico pode de fato afetar ou não as decisões do paciente. Caso afete, é importante negociar pelo menos um mínimo de informação que o paciente deve saber para que seus resultados não sejam prejudicados, ou pelo menos que outra pessoa próxima receba estas informações.
Paciente ambivalente
Uma fração substancial dos pacientes têm sentimentos mistos sobre saber seu prognóstico: eles tanto querem, mas ao mesmo tempo têm medo de saber. Esses pacientes ambivalentes podem frustar os médicos porque podem ir e voltar na decisão a cada visita, querendo o oposto do que o médico propõe. A ambivalência também pode ser sutil: um paciente pode dizer verbalmente que quer falar sobre prognóstico, mas simultaneamente dá outros sinais — ele muda de assunto ou desvia o olhar.
O princípio para lidar com a ambivalência é discuti-la explicitamente, permitindo que os pacientes falem sobre os prós e contras. Entendendo a dificuldade do paciente em se decidir, o médico deve demonstrar compreensão e empatia sobre esta tensão, permitindo ao paciente levar o tempo que for necessário para decidir o que quer saber ou não.
Outra opção é definir para o paciente algumas opções sobre o que seria discutido caso ele aceite receber informações e como estas poderiam afetar suas preocupações e decisões. Ele não precisa saber de todos os pontos, mas pode optar por uma ou outra informação que ache mais relevante, dadas as opções.
As estratégias comumente usadas para revelar o prognóstico, incluindo realismo, otimismo e evitação, têm consequências indesejadas que nem sempre atendem pacientes, familiares e médicos. Perguntar aos pacientes o quanto eles querem saber pode facilitar uma discussão explícita que atenda às necessidades individuais de cada um.
Seja no caso dos pacientes que querem as informações de prognóstico, mesmo que sejam decepcionantes ou perturbadoras, ou no caso daqueles que querem limitar as informações recebidas, essa abordagem de entender os motivos e as reações emocionais de cada um permite aos médicos se alinharem com os desejos de seus pacientes, encontrando maneiras de falar sobre situações difíceis e orientando-os para decisões médicas sólidas.
Referências
[1] Prognostic disclosure to patients with cancer near the end of life, 2001, disponível em https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/11412049.
[2] Communicating with realism and hope: Incurable cancer patients' views on the disclosure of prognosis, 2005, disponível em http://ascopubs.org/doi/10.1200/JCO.2005.11.138.
[3] Prognosis communication in serious illness: Perceptions of older patients, caregivers, and clinicians, 2003, disponível em https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/14511159.
[4] Information needs of patients with cancer: Results from a large study in UK cancer centres, 2001, disponível em https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/11139312.